domingo, 3 de julho de 2011

Nuno Crato no círculo de fogo do escorpião


A reorganização da rede escolar começou em 2005 e, na primeira fase, visava encerrar todas as escolas do primeiro ciclo com menos de 10 alunos, tendo fechado mais de 2500 escolas.
A segunda fase começou em 2010 e levou ao encerramento de 700 escolas com menos de 21 alunos.
A nova fase do plano previa o encerramento até ao final deste mês de mais 654 escolas, mas a Associação Nacional Municípios Portugueses está a aproveitar a mudança na tutela do ministério da Educação e Ciência para adiar ad aeternum o fecho das escolas.

Sempre me maravilhou a capacidade dos portugueses chegarem a brasa à sua sardinha jurando e trejurando que estão a ajudar o próximo.
O que é uma escola com menos de 21 alunos?

A escola pode ter só ensino Básico ou pré-escolar e ensino Básico.
  1. No caso de só ter ensino Básico, a escola dispõe de uma ou duas salas e um professor do 1º ciclo.
    Vamos supor a situação mais favorável para a manutenção desta escola: existem 20 alunos. Consideremos uma distribuição com cinco crianças em cada ano de escolaridade.
    Temos um professor com quatro grupos de alunos concentrados em cada canto da sala: os que vão iniciar-se na leitura e no cálculo (1º ano), os que sabem alguma coisa (2º ano), os que já conseguem ler, escrever e conhecem os algoritmos da adição e sua inversa (3º ano) e, no último grupo, os mais avançados que sabem ler, escrever, conhecem os algoritmos da adição, subtracção e multiplicação e adquiriram algumas noções de ciências sociais e naturais (4º ano).
    Durante o dia o professor ocupa-se, em média, 90 minutos com os alunos de cada ano de escolaridade enquanto os outros, em geral, estão entretidos a fazer desenhos e pinturas ou a brincar com o Magalhães. Isto é trágico.
    Nas escolas em que todos os alunos de uma turma estejam no mesmo ano de escolaridade, as crianças estarão concentradas 4 vezes mais tempo nos conteúdos programáticos do ano que frequentam e poderão adquirir muito mais conhecimentos.

  2. Vejamos agora o segundo caso. A escola dispõe de duas salas, um educador de infância e um professor do 1º ciclo.
    Vamos supor, de novo, a situação mais favorável para a manutenção desta escola e uma distribuição equitativa.
    Na sala do ensino Básico a única diferença é que são dezasseis os alunos distribuídos pelos quatro cantos da sala. A metodologia, inexoravelmente, tem de ser a mesma, o docente tem de andar de grupo em grupo, não pode ir para o quadro explicar assuntos do 4º ano porque os alunos do 1º ano não conseguiam perceber.
    Na sala do pré-escolar o educador de infância tem que desenvolver actividades lúdicas com quatro crianças de 4 ou 5 anos e, se dispuser de equipamento, as crianças poderão desenvolver capacidades. Mas é um desperdício de recursos ter um educador, que aufere o mesmo vencimento de um professor do 12º ano, a supervisionar as actividades lúdicas de quatro crianças.
Claro que há excepções.
Claro que a deslocação das crianças é um incómodo para os autarcas que têm de organizar o transporte dos miúdos de modo a não exceder 20 minutos e, sobretudo, ouvir duras criticas dos seus pais sobre o estado a que deixaram chegar as estradas que ligam as povoações ao local do agrupamento de escolas.
Claro que o fecho das escolas é doloroso para os educadores de infância e para os professores do 1º ciclo que serão lançados no desemprego.

Mas os contribuintes pagam a educação para que as crianças possam adquirir conhecimentos e desenvolver capacidades, não é verdade?

As toupeiras do ministério, direcções regionais de educação incluídas, já começaram com as fugas de informação, logo amplificadas por associações de autarcas, confederações de pais que, muitas vezes, são simultaneamente professores e pela comunicação social.
Nuno Crato tem de tomar uma decisão sobre o fecho das escolas até ao final deste mês de Julho, senão deixar-se-á prender num círculo de fogo, como aquele que os asiáticos costumam atiçar à volta de um escorpião.

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